terça-feira, 19 de abril de 2011

Entrevista_José_de_Sousa_Martins_Jornal_O_Estado_de_São_Paulo.

Sociologia  I
Aula 05
A Sociologia e o trabalho do Sociólogo
Prof. Adriano M. de Almeida
 
Análise de texto:      Entrevista  do jornal : “O Estado de São Paulo” (Flávia Tavares) com o Sociólogo José de Souza Martins( professor de Sociologia da USP).

              No fim de semana passado, três homens suspeitos de roubo foram linchados na periferia de Salvador. No sábado, Emílio Oliveira Silva e Michael Santa Izabel, acusados de saquear residências da vizinhança, foram linchados por mais de 30 pessoas. Emílio foi morto a pauladas. Domingo, a vítima foi um homem de identidade desconhecida. Ele também foi perseguido por mais de 30 moradores, que o acusavam de roubar uma TV. Morreu no local, a 200 metros de onde Emílio e Michael foram atacados. Na noite de segunda-feira, em Ribeirão Preto (SP), o estudante Caio Meneghetti Fleury Lombardi, que invadiu um posto de gasolina, atropelou o frentista Carlos Pereira Silva e tentou fugir, sofreu uma tentativa de linchamento. Por fim, na quinta-feira, um adolescente da Fundação Casa (ex-Febem) foi linchado até a morte por outros internos, em Franco da Rocha (SP).Foram cinco casos noticiados em 6 dias. Não se trata de uma epidemia - em nosso contexto, é algo normal. José de Souza Martins, sociólogo e colaborador do Aliás, estuda linchamentos há quase 30 anos e documentou 2 mil casos (...).
O Brasil é o país que mais lincha no mundo? - Possivelmente.  Isso nos últimos 50 anos, período que minha pesquisa abrange. Não dá para ter certeza, porque linchamento é o tipo de crime inquantificável. Mesmo os americanos, quando tentaram numerar seus casos, tiveram fontes precárias. O linchamento é um crime altruísta, ou seja, um crime social com intenções sociais. O linchador age em nome da sociedade. É um homem de bem que sabe que está cometendo um delito e não quer visibilidade. Por outro lado, no Código Penal brasileiro não existe o crime de linchamento, somente o homicídio. Então, ele não aparece nas estatísticas. Os casos são diluídos. Estimo que aconteçam de 3 a 4 linchamentos no País por semana, na média. São Paulo é a cidade que mais lincha. Depois, vêm Salvador e Rio de Janeiro.
Que análise o senhor faz de um país habituado ao linchamento? -   As sociedades lincham quando a estrutura do Estado é débil. Há momentos históricos em que isso acontece. Na França, depois da 2ª Guerra Mundial, quando não havia uma ordem política, havia a tonsura (a raspagem dos cabelos) de mulheres que tiveram relações sexuais com nazistas. Era uma forma de estigmatizar, para que ela ficasse marcada. O linchamento original, nos Estados Unidos, tinha essa característica.
O que configura um linchamento?É  uma forma de punição coletiva contra alguém que desenvolveu uma forma de comportamento anti-social. O anti-social varia de momento para momento e de grupo para grupo. Na França, ter traído a pátria era um motivo para linchar. No caso da Itália, aconteceu o mesmo. No Brasil, é o fato de não termos justiça, pelo menos na percepção das pessoas comuns. Nesse caso do atropelamento de um frentista em Ribeirão Preto, por exemplo, o delegado decidiu inicialmente por crime culposo (depois mudou para doloso). As pessoas que tentaram linchar o rapaz acreditavam que não haveria justiça, já que a pena seria mais leve por conta da atenuante.
Qual o perfil de quem é linchado?Em  geral, é linchado o pobre, mas há várias exceções. Há uma pequena porcentagem superior de negros em relação a brancos. Se um branco e um negro, separadamente, cometem o mesmo crime, a probabilidade de o negro ser linchado é maior.
Que criminoso é mais vulnerável?O  linchado pode ser desde o ladrão de galinha até o estuprador de criança. Sem dúvida, os maiores fatores são os casos de homicídio. Se a vítima do assassino é uma criança ou um jovem, ou se houve violência sexual, os linchamentos são freqüentes. Há muitas ocorrências por causa de roubo, especialmente se o ladrão é contumaz. Acredito que tenha sido o caso dos rapazes em Salvador. A própria população estabelece uma gradação da pena que vai impor ao linchado. Esta é a dimensão de racionalidade num ato irracional.
Como funciona essa gradação?Um  ladrão de galinha vai sair muito machucado - e pode acontecer de ele morrer. Mas o risco de ser queimado é mínimo. Com o estuprador é o contrário. Há também uma escala de durabilidade do ódio. Se um ladrão sobreviver durante 10 minutos de ataque, está salvo. Tem havido muitas tentativas de linchamento em acidentes de trânsito. Mas normalmente a polícia chega logo e evita o ataque.
Mulheres são linchadas?É  raríssimo. Nos 2 mil casos que estudei, há dois ou três em que uma mulher foi a vítima. Agora, há muitas mulheres linchadoras no Brasil. Mulheres e crianças.
Quem são os linchadores no Brasil?Não  há tanto uma divisão de ricos e pobres. De modo geral, os linchamentos são urbanos. Ocorrem em bairros de periferia. Porém, há linchamentos no interior do País, onde quem atua é a classe média. O caso mais emblemático é o de Matupá, no Mato Grosso. O linchamento foi filmado e passado pela televisão, no noticiário. Três sujeitos assaltaram o banco, a população conseguiu linchá-los e queimá-los vivos. Isso foi a classe média. E quando a classe média lincha, a crueldade tende a ser maior, porque ela tem prazer no sofrimento da vítima. O pobre é igualmente radical, porém é mais ritual na execução do linchamento? [...].
Estamos todos sujeitos a participar de um linchamento?Se  você tem valores bem fundamentados, não vai participar de um linchamento. Ele envolve pessoas cuja referência social é frágil. O problema é que elas são maioria no Brasil. Estima-se que 500 mil brasileiros tenham participado de linchamentos nos últimos 50 anos. Não é um número pequeno.

Matéria de Flávia Tavares para o caderno "Aliás", do jornal: O Estado de São Paulo. de 17 fev. 2008 Disponíveol em http://www.estadao.com.br/. acesso em:25 de nov.2008.

2 comentários:

  1. Questionamentos sobre a entrevista:

    1º) Por que a jornalista pediu para José de Sousa Martins falar sobre o tema?

    2º)Como ele procura fugir do senso comum ao falar do assunto?


    Orientações: para segunda questão, utilizar as características do senso comum, passado em aula anteriormente: superficialidade; imediatista; acrítico; cheio de sentimentos e cheio de preconceitos.

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  2. pergunta:como ciência e a sociologia tem um duplo valor....comente.

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